BUSCA INSANA PELO MAIS BARATO – Engº Paulo Q. M. Barreto

Ninguém joga dinheiro fora intencionalmente, mas a busca insana pelo mais barato conduz a situações que podem gerar despesas futuras desnecessárias e passivos não percebidos, devido a atitudes impensadas e irresponsáveis.
Em geral, quem compra o mais barato, acaba, na verdade, gastando mais do que o previsto ou mais do que economizou, em boa parte das contratações de prestação de serviços e compras de produtos, já que, poderão surgir retrabalhos, modificações, maior investimento na implantação de um projeto ou maior despesa futura em manutenção e vida útil.
Nas relações entre contratantes e contratados, observa-se o enorme despreparo do setor de compras para exercer sua principal função. Após definidos a prestação de serviços ou a compra de produtos técnicos, o candidato a fornecedor tende invariavelmente a negociar com o setor de compras, cujo parâmetro mais importante — e por vezes o único — é o preço. Surge aí a figura do “lesa-empresa”, ou seja, aquele que, mesmo sem perceber, irá prejudicar a empresa ao adquirir produtos ou serviços agindo desta forma. Muitas vezes sem ser retroalimentado quanto aos prejuízos causados. E o pior é que o “lesa-empresa” ainda é premiado por isso, haja vista que algumas empresas inserem na remuneração do comprador um bônus proporcional à redução de preço obtida na compra.
É imprescindível que a área técnica participe do processo de contratação ou compra até o seu final, fazendo valer sua opinião, requisitos e especificações, a despeito das pressões de outros setores da empresa, que geralmente não terão de conviver com os efeitos desastrosos de uma contratação malfeita.
Por exemplo, aqueles que ainda compram disjuntor somente pelo valor da corrente nominal e quantidade de polos (50 A – 3P), ou cabo somente pela seção nominal (10 mm2), ou quadro de distribuição somente pela quantidade de polos (24 polos), ou eletroduto somente pelo diâmetro de rosca (Ø1”), precisam rever urgentemente seus procedimentos.
Certa vez um lesa-empresa pressionou tanto um fornecedor para reduzir o preço que este retirou o filtro de harmônicas do inversor de frequência da máquina para chegar no preço desejado (já que o comprador nem tinha ideia do que isso se tratava e também não o havia especificado). Após a energização e testes da máquina, percebeu-se o elevado valor da corrente (acima do previsto no projeto). Questionado, o fornecedor da máquina apresentou a brilhante solução: bastava adquirir filtros de harmônicas, … cujo preço de compra, a essa altura da história, era outro …
Mediante esse e tantos outros exemplos que surgem todos os dias, será que compradores e diretoria ainda não aprenderam que não existe o almoço de graça?
Este artigo foca a contratação de prestação de serviços de natureza intelectual e a costumeira alteração de especificação técnica em prol da enganosa redução de custos, maximização do lucro, otimização, reengenharia e tantos outros rótulos que representam sempre a mesma atitude: a busca insana pelo mais barato.

Serviços de natureza intelectual

O êxito dos serviços de natureza intelectual – contratação de projeto, consultoria, assessoria técnica, perícia, inspeção e serviços análogos – reside na competência do fornecedor.
Já é mais do que sabido que não se deve comprar serviço de natureza intelectual da mesma forma que se compra sacos de lixo. Ou será que o comprador quando vai escolher um médico ou laboratório para um tratamento de saúde, também abre uma planilha com dez colunas e opta pelo menor preço?
Em serviços de natureza intelectual, por melhor que se defina um escopo, a forma de realizar o serviço é extremamente imponderável e diferente de um profissional para outro. Portanto, é bizarro tentar equalizar propostas para serviços desta natureza.

Especificações técnicas

Por vezes, com o objetivo de comprar mais barato e “esmagar” o instalador, um projeto de instalações elétricas e hidráulicas elaborado de forma competente, com memorial descritivo e adequada especificação de materiais é modificado para que a execução se torne mais barata. Ora, as decisões do projetista não devem ser alteradas por pessoas que desconhecem as premissas, as decisões e os parâmetros que foram previamente definidos. Por conta de alterações irresponsáveis, que descaracterizam o projeto, pode-se colocar em risco a segurança do empreendimento e ainda gerar passivo despercebido. Alterações podem ser propostas, mas devem ter o aval do projetista para serem realizadas.
Afora esses dissabores, cabe ainda invocar o Art. 18 da Lei Federal nº 5194/1966, que regulamenta as profissões de engenheiro e engenheiro-agrônomo: “As alterações do projeto ou plano original só poderão ser feitas pelo profissional que o tenha elaborado. Parágrafo único – Estando impedido ou recusando-se o autor do projeto ou plano original a prestar sua colaboração profissional, comprovada a solicitação, as alterações ou modificações deles poderão ser feitas por outro profissional habilitado, a quem caberá a responsabilidade pelo projeto ou plano modificado”.

ENGº PAULO Q. M. BARRETO
BARRETO ENGENHARIA
Vice Presidente de Relações Técnicas da ABRASIP
Revista do Sindinstalação Ano 2 – Edição nº 30 – Setembro 2018